
2ª Secção – TUTELA DOS DIREITOS
Duplo prejuízo para os advogados
Notas sobre a prescrição de direitos no Código Civil e na Lei do Contrato de Seguro
A presente comunicação aborda duas questões penalizadoras para os advogados, relacionadas com o instituto da prescrição de direitos.
A primeira refere-se à prescrição do crédito de honorários. Encontrando-se em causa um crédito desta natureza a prescrição do direito ocorre no prazo de dois anos – art.º 317.º al. c) do C.C..
Tal prescrição, integra-se no capítulo das prescrições presuntivas. Este instituto foi criado para defesa do devedor, dado que nas obrigações de prazo curto não era costume exigir documento de quitação.
Sucede que a prescrição de dois anos destes créditos não faz, atualmente, qualquer sentido.
A questão merece uma brevíssima análise histórica, pois, à data da entrada em vigor do Código Civil, não era obrigatória a passagem de recibos pelos advogados. Essa obrigação só passou a existir mais tarde. Por este motivo é que a prescrição presuntiva fazia sentido. Só por este motivo. Mas, neste momento, já não, pois o advogado é obrigado a passar recibo oficial, e mais sucede que o próprio pagamento tem de constar de registo escrito, por regra.
Acresce, por último, que a prescrição presuntiva tem sido invocada pelo devedor… relapso, o que constitui a sublime perversão do sistema.
Face ao exposto, o prazo de prescrição do direito a honorários dos Advogados deve passar a ser o prazo ordinário de 20 anos, semelhante, aliás, ao da responsabilidade civil profissional do advogado. É urgente, portanto, promover a eliminação desta norma, através do competente órgão da Ordem dos Advogados.
A segunda questão prende-se com perigo emergente do disposto no art.º 121 n.º 2 do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16 de Abril, que dispõe o seguinte: “Os restantes direitos emergentes do contrato de seguro prescrevem no prazo de cinco anos a contar da data em que o titular teve conhecimento do direito, sem prejuízo da prescrição ordinária a contar do facto que lhe deu causa”.
Esta norma insere-se no Titulo I da lei, ou seja, numa espécie de parte geral, e em concreto no Capítulo XI, intitulado “Disposições Complementares”. O estabelecimento da prescrição dos “restantes” direitos no prazo de cinco anos mostra-se algo preocupante.
Na realidade, a responsabilidade civil do Advogado assume natureza contratual, sendo o prazo de prescrição de vinte anos, o que significa que neste período o cliente pode demandar o Advogado com base nesses factos.
Porém, do disposto no referido art.º 121º n.º 2 parece resultar que na relação entre o advogado e a seguradora, o prazo de prescrição é de apenas cinco anos, a contar do conhecimento do facto. Ou seja, a referida norma inculca a ideia de que a seguradora pode suscitar a prescrição do direito do advogado de invocar o contrato de seguro findo esse prazo.
E assim, decorridos cinco anos sobre o facto gerador, o Advogado pode vir a responder sózinho, com o seu património pessoal, perante o cliente. Basta que a seguradora invoque a prescrição do direito, nestes termos.
É certo que no capítulo dedicado ao seguro de responsabilidade civil, e concretamente no artº 145º do diploma, se prevê a aplicação dos prazos de prescrição do Código Civil nos direitos do lesado contra o segurador. Mas, o lesado só tem direitos contra o segurador se a validade do contrato fôr inatacável. Ora, se o direito do advogado a invocar o contrato fôr declarado prescrito, o lesado deixa de dispôr de cobertura da seguradora.
Esta é, naturalmente, uma interpretação desconfiada. Veja-se, no entanto, o que tem sucedido com as trocas de seguradoras de responsabilidade civil escolhidas pela OA, ao longo dos últimos anos.
Trata-se, assim, de questão com particular acuidade, merecedora de debate.
C O N C L U S Õ E S:
1ª – A prescrição de dois anos dos créditos dos Advogados não faz qualquer sentido.
2ª – À data da entrada em vigor do Código Civil não era obrigatória a passagem de recibos pelos advogados, compreendendo-se assim a prescrição presuntiva.
3ª – Neste momento o advogado é obrigado a passar recibo oficial, e o próprio pagamento tem de constar de registo escrito.
4ª – A prescrição presuntiva tem sido invocada pelo devedor… relapso, quando o legislador pretendeu proteger o cumpridor.
5ª – Em suma, o prazo de prescrição deve passar a ser o ordinário.
6ª – Sendo de 20 anos o prazo de prescrição da responsabilidade civil do advogado, nesse período pode ser demandado com base em factos geradores dessa responsabilidade.
7ª – Porém, do disposto no art.º 121 n.º 2 do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, parece resultar que na relação entre o advogado e a seguradora, o prazo de prescrição é de apenas cinco anos (a contar do conhecimento do facto).
8ª – E assim, decorridos cinco anos sobre o facto, o Advogado pode vir a responder sozinho, com o seu património pessoal, perante o cliente, bastando que a seguradora invoque a prescrição do direito, com base neste preceito.
9ª – Trata-se de questão merecedora de debate, com vista a ser promovida pela Ordem alteração legislativa protetora dos nossos legítimos direitos.
Porto, 4 de Maio de 2018
Gabriel Araújo Correia – CP 4211P